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slavs and tatars

Zulf (brunette)

slavs and tatars  Zulf (brunette)

source: slavsandtatars

Slavs and Tatars is a faction of polemics and intimacies devoted to an area east of the former Berlin Wall and west of the Great Wall of China known as Eurasia. The collective’s work spans several media, disciplines, and a broad spectrum of cultural registers (high and low) focusing on an oft-forgotten sphere of influence between Slavs, Caucasians and Central Asians.
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source: momaorg

Slavs and Tatars (founded 2006) is a collective whose installations, performance lectures, publications, and artist’s multiples reflect upon intercultural relations and the perceived differences between Western cultures and the Eastern world. Pursuing an unconventional research-based practice, the group identifies the “area east of the former Berlin Wall and west of the Great Wall of China known as Eurasia” as their point of reference, and with much wit and wordplay, their projects address the transmission and hybridization of traditions, politics, and language within in the region. For Projects 98, Slavs and Tatars build upon a recent cycle of works which examines the concept of the anti-modern and will realize a new installation titled Beyonsense, which takes its name from a translation of zaum—the Futurist experiments with transrational language and poetry. The collective’s first solo museum presentation in the United States, Beyonsense will feature a reading room populated by a number of Slavs and Tatars’ text-based objects and printed editions, transforming the gallery into a space for reflection and pause to contemplate the mystical and affective sides of modernism.
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source: brblouinartinfo

A narrativa fundadora do coletivo de artistas Slavs and Tatars é uma máxima muito conhecida que precede todos os seus projetos, criando uma cenografia de produção e apresentação repleta de saídas e entradas. Slavs and Tatars começou em 2005, e seus membros são descritos como “uma facção de polêmicas e intimidades devotados a uma área ao leste do antigo muro de Berlim e ao oeste da Muralha da China”. Inicialmente um grupo de estudos, o coletivo agora orbita em torno de seus dois membros centrais – que preferem continuar anônimos – enquanto a comitiva continua a se expandir e contrair para incluir outras pessoas em resposta a um dado projeto.

Os responsáveis principais são: um cidadão americano poliglota fluente em russo, formado em literatura comparada, com experiência em pesquisa e estratégia no setor privado russo, e um artista polonês imigrante formado em design gráfico, edição e instalação. Juntos, defendem uma postura editorial e curatorial ágil que é ao mesmo tempo cômica, séria e cataclísmica, incluindo publicações, performances, palestras e instalações, fomentadas e mergulhadas nas consequências da guerra fria e no conflito geopolítico contínuo entre o Oriente e o Ocidente. Contrabandeando uma sátira incisiva, esoterismos eruditos e interessantes, e muitas vezes um academicismo desapercebido nas mãos de um público desavisado, Slavs and Tatars se utiliza do estilo familiar e ainda sim bombástico dos tempos passados para mostrar algo mais facetado e dispersivo do que o que estamos acostumados a ver no meio das artes politizadas esquerdistas.

A instalação recente do coletivo, Beyonsense, no Museu de Arte Moderna de Nova York, é exemplar em termos de seu tom brincalhão e sincrético, e o título é uma tradução direta de zaum (um termo e estratégia utilizados por uma facção de poetas russos futuristas, como Velimir Khlebnikov). A carga tutelar da expressão transracional e da desconstrução implícitas no título emprestado é estendida ao encontro inicial com as esculturas absurdas contidas nas vitrines. Kitab Kebab, 2012, por exemplo, faz um espeto de livros vetados. Ao invés de servir carne köfte, uma lista de leitura antiga é literalmente trespassada, e as referencias analíticas de filosofia, religião e linguísticas são partidas ao meio, forçando-as a uma proximidade, resultando numa crioulização típica da abordagem afetiva do grupo em relação ao discurso.

Muitas vezes se constituindo como uma perversão satírica da escala de uma dada referência ou contexto cultural, as esculturas cenográficas de Slavs and Tatars desarmam possíveis recalques, preparando para o resto da operação. Ao invés de conter um verso ou escritura, Dear for the Dear, 2012, uma pequena rahle (ou banca sagrada de livros islâmicos), tem um picles marrom feito de madeira maciça, assim como Wheat Mollah, 2011, é uma mimese da forma de um adereço de cabeça dobrado associado com o clero islâmico – a única diferença é que é feito de trigo e equilibrado no topo de um tijolo. Espertas e contraditórias, estas piadas são reminiscentes das primeiras esculturas de Marcel Broodthaers, que atacavam o nacionalismo belga e a complacência da burguesia com o colonialismo, com o uso bem-humorado de mexilhões, carvão e ovos, ao lado de notícias do Congo. As colagens escultóricas de Slavs and Tatars, que misturam clichês e seriedade, também residem na tensão entre literalidade, crítica, e uma risada indiferente.

Se em Wheta Mollah a posição patriarcal da autoridade religiosa é simulada com a distorção de um simbolismo excessivamente soviético, o resultado híbrido e cômico é desconstruído pela presença angustiante e latente de um tijolo deslocado, que parece pronto para ser usado. De fato, se há um cenário predominante no trabalho coletivo é a narrativa da dualidade da ascensão de um Islamismo político e a dissolução do comunismo como influências dominantes do clima geopolítico atual. Através do subliminar, Slavs and Tatars se engaja numa estranha mistura das estratégias de propaganda e publicidade do capitalismo tardio, com um itinerário incansável de viagens de pesquisa, e uma proclividade pela cultura do campo e tradições místicas, religiosas e do êxtase.

A partir do desejo político de colocar em xeque qualquer versão grande e oficial que explique as condições periclitantes do começo do século XXI, Slavs and Tatars adotam uma postura de articulação heterocrônica, concedida pela própria eurásia e sua preocupação com sua auto-definição. Esse é o caso da instalação ao ar livre A Monobrow Manifesto, um balão, feito em 2010, no qual um herói épico persa do século XX, Rostam, flutua, semelhante e ao mesmo tempo em oposição ao personagem Bert, de Sesame Street. A preferência por fusões é encenado de forma muito clara nas instalações que dão boas vindas aos projetos do grupo, introduzindo o tom e a pulsão interativa proposta pelos trabalhos. No MoMA, isso se deu na forma de uma sala de leitura como uma série de tapetes persas pendurados na entrada, construindo uma barreira de som para os visitantes que entrassem silenciosamente neste recanto cheio de publicações de Slavs and Tatars. Contornada por bancos, com uma escultura de neon no teto e uma fonte central que cuspindo um líquido vermelho, a instalação citava um trabalho que Dan Flavin construiu para uma mesquita em Manhattan, e fazia também uma homenagem a um ato simbólico ocorrido no Teerã nos anos 80, quando a água da fonte de um cemitério foi tingida de vermelho para fazer um memorial às vitimas de Revolução Iraniana.

Uma articulação semelhante de referencias culturais e históricas esta em cada uma das instalações recentes do coletivo. Em 2012, na Secession, em Viena, a instalação Not Moscow Not Mecca evocava os estereótipos culturais e as associações rivais ligadas à frutas diferentes, invertendo interpretações como exóticas, preconceituosas, e banaiss, tornando-as intercambiáveis dependendo do contexto. Uma reprise da exposição Friendship of Nation: Polish Shi’ite Showbiz de 2011, em mostra até 24 de março no REDCAT, Los Angeles, jogou os slogans da Revolução Iraniana de 1979 e do movimento da Solidariedade Polonesa dos anos 80 em banners, comprimindo a urgência de épocas e lugares diferentes através de um etos multivocal de protesto como um agente de potencial revolucionário.

O papel principal das publicações de Slavs and Tatars fica mais claro no traçar compulsivo de histórias e genealogias de pensamentos filosóficos e culturais. Na publicações de notícias 79.89.09 (que levou à instalação Friendship of Nations), comparações – no estilo da pop arte – de fomento político no Irã e na Polônia dão vazão para uma crítica tangencial à política americana no Oriente Médio nos anos 1970, e a disputada eleição presidencial no Irã de 2009 que encorajou o Movimento Verde, existente até hoje. Em baixo de cabeçalhos que ecoam o Huffington Post, o Ok!, ou o Paris Match, assim como a herança da propaganda Bolchevique, Slavs and Tatars alternam manchetes como “Beviled, Bling Brutal” e “Resistir a Resistência a Deus” com “Confessionais Expressos” ou “Mix-Tapes do Islã Modernista” e “Sarmatismo”. O último deles conta os detalhes menos conhecidos do movimento dentro da szlachta (pequena nobreza) polonesa no século XVII, que clamava que a nobreza polonesa era descendente de uma antiga tribo iraniana da área do Mar Negro.

Num tom bem-humorado e até de piada, as publicações de Slavs e Tatars se alternam entre espertas e academicistas, como no catálogo de Not Moscow Not Mecca, que delineia o conceito do coletivo para um ciclo permanente de exposições, sob a rubrica de The Faculty of Substitution, usando como base a investigação tanto de práticas sagradas que buscam autoconhecimento, como a natureza mais profana de padrões de consumo e campanhas algorítmicas que procuram nomear o gosto individual. Ainda assim, dentro daquilo que por vezes pode parecer um documento de pesquisa muito amplo ou um panfleto político, Not Moscow Not Mecca entra em um perfil comovente de Henry Corbin, o filósofo francês de angelologia islâmica, antes de reimprimir na íntegra um texto do classicista americano Norman O. Brown, de uma série de palestras de 1981, The Challenge of Islam. Nele, Brown diz que Muçulmanos e Cristãos são diferentes interpretações do mesmo Hebraísmo e Helenismo, semelhantes e ligados em síntese, não simplesmente divididos. Not Moscow Not Mecca também nos dá uma leitura aprofundado do Alcorão em diálogo com a relíquia modernista de James Joyce, Finnícius Revém. Resumindo, o coletivo traz um conjunto às vezes espantoso, mas sempre dedicado e surpreendente de influências, daquilo que muitas vezes está nos confins arenosos e relativistas da produção recalcada e previsível da arte contemporânea.

Talvez nada seja melhor para entender a abordagem intertextual do coletivo do que a publicação de 2011 Molla Nasreddin: a revista que teria, poderia, deveria, que traduz e recoloca em circulação excertos de um jornal de sátira política de 1906-1930, primeiro em Tbilisi, Geórgia, depois brevemente no Irã, e mais tarde em Baku, no Azerbaijão. Tão exigentes e conflitantes quanto as ilustrações políticas de Honoré Daumier eram em relação ao levante político da Paris na metade do século XIX, as páginas de Molla Nasreddin restam sobre um desvio não muito familiar da sátira secular pro-armênia, ridicularizante dos russos, anti-islamista, que corrompe e corrói as narrativas óbvias e oficiais da modernidade na região. Seu nome deriva de um sábio Sufi que se tornou tolo na Idade Média, Molla Nasreddin traz uma animação para Slavs and Tatars quase como um mascote ao revés, ainda que hajam diferenças ideológicas marcantes, se abrindo para uma pequena rachadura de otimismo. Se recusando a se retirar do peso de seu tempo, escolhe desarmá-lo com risadas ao invés de reparação ou correção. O nome do coletivo, que vem em parte do termo Tatar (se referindo ao alinhamento de grupos nômades que se formou em volta do Lago Baikal, na Sibéria, e eventualmente subsumiu à parte oeste do império de Genghis Khan, e que mais tarde passará a significar um courier à cavalo), Slavs and Tatars incorpora o modo polifônico da tradução direta e das diferenças narrativas, explorando o fato de que a mensagem é secundária em relação ao papel do mensageiro.